O Supremo Tribunal Federal (STF) decidiu que a terceirização de atividades-fim não impede o reconhecimento da relação de emprego em casos onde essa prática configura dissimulação do verdadeiro empregador. A decisão ocorreu no contexto da Reclamação (RCL 60454), na qual uma rede de varejo contestava o reconhecimento de vínculo empregatício entre a empresa e trabalhadores de uma oficina de costura contratada por intermédio de uma empresa terceirizada.
O ministro Flávio Dino, relator do caso, argumentou que, apesar da jurisprudência do STF permitir a terceirização, a relação de emprego deve ser reconhecida quando o modelo de contratação é utilizado de maneira fraudulenta. Em seu voto, Dino destacou que “nenhum dos precedentes impede o reconhecimento de vínculo de emprego em situações específicas”. Ele enfatizou que o vínculo empregatício não é obrigatório, mas sim resultado de uma análise particular, em função dos contornos próprios de cada caso.
O julgamento foi decidido por unanimidade pela 1ª Turma do STF, com todos os ministros acompanhando o voto do relator. A decisão reforça a jurisprudência que, embora permita a terceirização, considera a possibilidade de fraude na utilização desse modelo de contratação.
A Advocacia-Geral da União (AGU) defendeu no processo que houve fraude na terceirização das atividades de costura, descaracterizando a natureza desse tipo de contrato. De acordo com a AGU, a reclamação da empresa não deveria ser aceita, uma vez que, no caso específico, não houve desrespeito à jurisprudência do STF sobre terceirização. A reclamação, tipo de ação cabível em situações de decisões judiciais contrárias a entendimentos da Suprema Corte, não poderia modificar o reconhecimento da relação de emprego.
A fiscalização do Grupo de Combate ao Trabalho Escravo Urbano da Superintendência Regional do Trabalho e Emprego de São Paulo identificou irregularidades graves. Verificou-se que a empresa terceirizada carecia de estrutura básica para realizar a produção, como maquinário e funcionários, subcontratando, assim, oficinas de costura sem regularização. Além disso, os auditores relataram a utilização de mão de obra em condições análogas à escravidão, com trabalhadores estrangeiros em situação de vulnerabilidade e sem documentação regular, submetidos a condições de trabalho degradantes.
Em decisão do Tribunal Regional do Trabalho da 2ª Região (TRT2), foi determinado que a rede de varejo tinha controle sobre toda a cadeia produtiva da empresa terceirizada, responsável por 90% da produção destinada ao grupo. Tal nível de controle e dependência econômica configurou os elementos necessários para o reconhecimento da relação de emprego, conforme previsto pela legislação trabalhista brasileira.
A AGU, representando a União, defendeu a atuação dos fiscais que autuaram a rede de varejo por práticas irregulares. A advogada da União e coordenadora-geral do Departamento de Controle Difuso da Secretaria-Geral de Contencioso, Priscila Piau, ressaltou a relevância do julgamento para assegurar os direitos dos trabalhadores em um cenário de interpretações jurídicas desfavoráveis sobre a terceirização.
A advogada afirmou que a decisão do STF demonstra uma vitória significativa para a defesa dos trabalhadores, especialmente em situações onde há abuso na prática da terceirização. Segundo Priscila, a AGU conseguiu demonstrar que, neste caso, houve desvios que justificaram o reconhecimento do vínculo empregatício, assegurando a aplicação dos direitos trabalhistas frente a tentativas de dissimulação da relação de trabalho.
A decisão reforça a possibilidade de reconhecimento de vínculo de emprego nos casos em que a terceirização oculta o empregador real, destacando o compromisso das instituições com a proteção dos direitos trabalhistas e o combate a práticas fraudulentas.
Matéria: Portal Contábeis
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